quarta-feira, 23 de março de 2011

4ª Parte


Cabronça

Quem disse que bode não come onça?

Esse é um dos mistérios que Hécate conduziu até Elas Duas.

Cabronça o fruto do Amor bizarro de um bode por uma onça.
Unge, um bode suíço que emigrou para o Brasil, se apaixonou por Ya’wara, uma onça pintada, que vivia solitária na mata, em sua toca na curva do rio.
Desse amor nasceu Gigi, uma cabronça com pintas, olhos, bigodes, cauda e coragem de onça. Mas também com orelhas compridas, chifres, pernas, patas e obstinação de cabra.

Não satisfeita com sua aparência, decidiu fazer umas alterações e esfregou os chifres nas pedras do rio até diminuir o tamanho.
Pediu às formigas e abelhas para picarem sua cara até arredondar a expressão caprina.

Mas ainda não foi o suficiente, ela tinha planos ousados,
queria a fama e despedindo-se dos pais, partiu para a cidade.

Ao chegar a São Pedro viu um cartaz que anunciava a Exposição Cabras da Serra e saiu indagando quem poderia prepará-la para participar também.
Até que uma estranha anciã com os cabelos luminosos saindo por baixo do manto,
disse para ela buscar ajuda no ateliê “Delas Duas”, pois as mãos das artistas haviam sido abençoadas pelas Deusas Antigas.

Assim ela fez, Cabronça Gigi foi atrás Delas Duas
pedindo para a deixassem tão bonita como sua mãe e tão amorosa quanto seu pai.


Elas duas trabalharam duro, mas Gigi ficou radiante com o resultado.
A pele de veludo pintado brilhou,

os chifres foram transformados em pequenas cornucópias de ouro,
o rabo ergueu arrebitado, os olhos felinos brilharam enfeitados de cristais.


E finalmente, uma fita de cetim dourado com imensos strasses,
adornou o belo pescoço de Gigi.

Com uma extravagante beleza,
a exótica criatura foi logo contratada para ser recepcionista no Restaurante Toca da Onça e participou do concurso da Cabra da Serra mais bonita.

Gigi, a única Cabronça do planeta, produzida por Delas Duas, na Terra Encantada.

3ª Parte

A Iniciação

Conta a lenda que é São Pedro quem escolhe seus adotados e

que só depois de um Ritual de Passagem é que se pode se dizer um cidadão são pedrense.
Assim foi também com “Elas Duas”.

Fatos inusitados conduziram as duas por um Ritual de Iniciação.

Aconteceu na noite do Equinócio de Outono,

o Ano Novo Astrológico, quando se alinharam às energias interiores masculinas e femininas com o fluxo do Espírito do Céu na Terra e no centro do coração.

Foi liberado tudo que não era Luz Divina

e equilibrado as complementaridades masculinas e femininas na co-criação.

As Duas celebravam a data, com brindes à Grande Mãe,

com os olhos dirigidos à Grande Pedra que oculta o nascente,

quando um foco de luz foi se elevando por traz da mata, desenhando um Portal na rocha.

Paralisadas e mudas permaneceram as duas,

enquanto pelo Portal passavam seres vindos de outras dimensões.
Por fim, uma diáfana e longilínea figura,

trazendo nas mãos uma correia de prata
que segurava um enorme cão com três cabeças,
materializou-se diante Delas Duas.
Uma visão aterradora pelas próprias circunstâncias,

mas ao mesmo tempo tranqüilizadora
pela intensidade de Luz que clareava e tudo a sua volta.


Era Hecate, a Deusa tríplice da Lua.
Com um aspecto não terrestre, ela é a Grande Feiticeira.

Deusa das Trevas, filha dos Titãs Perses e Asteria.

Hecate é a Deusa das trevas e dos mistérios da noite.
Em noite de Lua Nova, ela caminha na terra com seu cão fantasma.


Conta-se que uma grande honra chega para aquela,

cujas preces são recebidas favoravelmente por Hecate.

Não foram preciso palavras para que elas

compreendessem que a Deusa


as incumbia de uma tarefa muito especial,


era a Iniciação nos Mistérios da Cidade Encantada.

2ª Parte

Em São Pedro

A Roda do Tempo girou muitas vezes e o destino tramou o inevitável.

Em tempos diferentes e por motivos pessoais, cada uma saiu da beira-mar e subiu a montanha.

Uma estrada rústica e serpenteada levou-as através do tempo, da pequenina ilha feita de tintas e ilusão para Cidade Encantada na Montanha dos Desejos Realizados.

A filha das Deusas Antigas chegou devagar, buscando a paz e seu lugar ideal.
A sonhadora seguiu seu coração e enfrentou um desafio no retiro da cozinha de Buda.

Às Deusas não importam o tempo que medimos, elas transitam livremente pelo presente, passado e futuro. Assim como podem nos transportar para o reino das Fadas onde um dia nosso é um ano para elas.
Portanto, a história Delas Duas é uma viagem pelo tempo e pelo espaço.


Era uma noite quente de Lua Nova, Hécate a Deusa, puxou os cordões do destino “Delas Duas” e aconteceu o reencontro no Templo da Alegria.

A adoradora das Deusas já havia encontrado seu Lugar Sagrado, no alto da colina, voltado para o Leste, de onde ela podia assistir tanto o nascer do Sol como reverenciar a Senhora da Lua.
Sua casa possuía pernas como a de Baba Yaga e ela cuidava para que a alma da casa estivesse sempre feliz para não querer partir.

A sonhadora encontrou depois de algum tempo sua linda casinha de boneca, voltada para o crepúsculo e o lar da Ursa. Ela também mimava a alma da casa com enfeites e delicadezas.

As duas confessaram naquela noite, o quanto desejavam um espaço só seu, para fazerem suas artes.

Então a sonhadora inventou paredes invisíveis que sustentavam um teto que abrigava a artista e suas obras das intempéries, no jardim que rodeava a casa.
A adoradora escavou o morro sob a casa e descobriu que podia ter um céu azul sobre sua cabeça, em seu espaço subterrâneo.
E assim construíram seus ateliês.

1ª Parte

O Encontro


Era a época de preparar a Ilha da Fantasia para a famosa Temporada de Verão.

O trabalho fervia entre arquitetos, operários, artistas, paisagistas e glamurosos.

Elas ainda não se conheciam, quando foram convidadas para contribuírem com suas artes em espaços diferentes.

Uma dominava grandes áreas planas com texturas, pinturas especiais e decorativas.
A outra trabalhava sua criatividade nas três dimensões, tecendo materiais e técnicas diversas.

As Duas dedicavam-se às suas tarefas, cada uma se esmeravam para obter o melhor resultado.
Os espaços possuíam personalidades próprias, definidas pela intenção do uso.

A cultuadora de Deuses homenageou um Budha de Pedra
com muitas flores, cristais e símbolos.
Espelhos decorados captavam o sereno verde-mar transformando o pequeno deck num recanto de Paz e Meditação Zen.

Ao decidir que já estava concluído o trabalho, ela saiu caminhando
pela ilha para conhecer os outros ambientes.

Deteve-se num agradável terraço que se debruçava sobre o mar,
protegido por cortinas esvoaçantes e toldos brancos,
tendo alvos sofás distribuídos preguiçosamente pelo espaço.
Passeou o olhar em cada detalhe até que se deteve
na enorme parede azul
que estava sendo coberta por libélulas e borboletas.

A adoradora de cores e flores foi atraída pela visão
como a abelha é atraída pelo néctar.

Uma Fazedora de Asas Coloridas dava as últimas pinceladas.
E não percebeu a visitante, que em silenciosa admiração observava
os movimentos das suas mãos conduzindo pincéis como varinhas mágicas, fazendo aparecer multicoloridas borboletas e libélulas no azul.

E por uma fração de tempo o Caminho da Adoradora de Flores e Cores cruzou com o da Fazedora de Asas Coloridas.